segunda-feira, abril 30, 2007

"Se Hoje fosse Domingo"

"(...) Devo dizer-te que nunca suspeitei de nada. Agora que olho para trás e tento compreender, tenho a certeza que nunca deixaste nenhum sinal, um indício qualquer, um simples olhar, qualquer coisa que me fizesse pensar. Insisto que te via todos os dias, excepto aos domingos.(...) Já não somos crianças, como sabes não foste a primeira, mas ainda te hoje repito que só a ti amei a sério. Porque razão fingiste até ao último momento? Porque motivo corrias para mim (...)com o sorriso que sempre adorei?
Não sei se quero recordar, embora tenha a certeza que nunca esquecerei. Também deves lembrar-te. (...) Quando fui ao vosso encontro, só queria não ver o que estava certo de encontrar, tu a curtir com um gajo qualquer (...).
Não houve ralhos nem zangas, gritos ou cenas foleiras. Tudo acabou com a tua frieza e o teu olhar distante, já não gostavas de mim, pronto.
Oh, como fiquei cansado! Como desejei morrer naquele instante, como senti o mundo a desfazer-se à minha volta! Quero que saibas que a raiva tomou conta de mim por breves instantes, envergonho-me mas digo-te: apeteceu-me que morresses comigo, se não eras minha não poderias ser de mais ninguém.
Depois uma estranha calma tomou conta de mim. (...)
O tempo ajuda, podes crer. Hoje é sábado sinto saudades do teu corpo. Amanhã não te vou ver, mas não faz mal, nunca te veria. O que me custa é ter que dar explicações aos meus pais, nunca poderão perceber como te amei. Os pais pensam sempre que são namoricos sem importância, não entendem como a minha vida era feita a pensar em ti. Vê lá o meu pai até disse que não há falta de mulheres! Se calhar ainda não percebeu nada...
Se hoje fosse domingo, ia à tua procura. parava a mota à esquina do restaurante e ficava a ver-te, tenho a certeza que continuas a sentar-te naquela espécie de montra. de frente para a estátua. Amanhã, olha em frente: devo estar lá, vê com cuidado, conheces-me bem, sou mesmo eu."

Daniel Sampaio in Se hoje fosse domigo - Público

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